Chocar bondes, antes de mais nada, deve ser algo difícil de se imaginar nos dias de hoje. Esse termo, muito utilizado nos idos de 50, principalmente pelos moleques, morreu junto com os bondes, mas era uma brincadeira perigosa e talvez por isso, uma das preferidas da turma.
Ela consistia em se correr atras do bonde, pular no estribo e ficar dependurado neles até que o cobrador viesse nos pegar,(e eles sempre vinham).
A essa altura, voce era obrigado a saltar do bonde ou levar uns cascudos.Quando o bonde estava em velocidade o importante era saber pular e saber cair para não quebrar uma perna.
Essa molecada era constiuida de garotos de 8 a 11 anos no maximo, que na sua maioria, moravam na Javari ou Visconde de Laguna ou Rua dos Trilhos e alem da escola, ainda não tinham muito o que fazer. Uns já ajudavam os pais e todos iam à escola, mas sempre sobrava tempo para a pelada de rua ,ver o treino do Juventus e as quartas-feiras assistir ao ensaio da Banda no Romanato, só não podia fazer barullho.
Com as mães trabalhando o dia inteiro no Crespi, todos tinham bastante tempo para se aventurar com os bondes.
O ponto final dos bondes era na Rua da Mooca, esquina com Paes de Barros. (Bondes 08 Mooca e 11 Bresser).
Ali o pessoal descia e quem ia para cidade, aproveitava para subir. Ele virava na Rua Taquari e logo em seguida na Rua Javari, percurso muito pequeno para desenvolver uma velocidade maior e local ideal para a molecada chocar.
Já na Javari ele desenvolvia uma boa velocidade, tendo que frear na esquina da Rua Visconde de Laguna, onde a gente tinha que pular, para fugir do cobrador e os vizinhos não verem.
O perigo real era com os carros que apesar de raros, existiam e os motoristas nunca esperavam ver um garoto pulando do bonde na frente do carro. Outro perigo era alguem ver e dedar para sua mãe ou seu pai, o que invariavelmente resultava em uma surra.
Eu me lembro que esse era o esporte radical da época, quando sua adrenalina tinha oportunidade de subir, ou de medo do cobrador te pegar ou de ter que pular muito antes da esquina, torcendo para não pegar um paralepipedo torto e quebrar uma perna no tombo.
Acredito que toda molecada tenha participado dessa brincasdeira, o Helio, o Ladionel, o Valdir, o Cosmo, o Milton, o Toninho, o Roberto, o Valter , o Pé de pato, o Ricardo, o Angelo, eu, etc., mas o melhor na modalidade era um baininho de Palmeiras dos Indios chamado Itamar, que pela agilidade e esperteza colocava todos nós no bolso, fazendo os cobradores correrem atras dele pelo bonde todo, atravessando de um lado ao outro e sempre pulando na esquina da Visconde de Laguna.
A essa altura o cobrador o estava chingando e ele retribuindo as ofensas dando bananas com os punhos ou mandando beijinhos e chamando os cobradores de paneleiros, palavrão que nos foi ensinado pelo seu Manoel ,(padeiro) e que para grande parte dos brasileiros não era ofensivo, pois não conheciam o significado da palavra, mas os cobradores conheciam.
Foram tempos em que até os moleques eram mais educados e os palavrões mais pesados ficavam para ser usados somente nas brigas das peladas de rua.
Tempos bons que sempre trazem saudades.
Edgard Romanato